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Uma nova crise na agricultura dos EUA se aproxima

O cinturão agrícola americano se encaminha para um marco histórico: Em breve haverá menos de dois milhões de fazendas nos Estados Unidos, a primeira vez que isso acontece desde que os pioneiros se mudaram para o oeste depois da Compra da Louisiana, em 1803.

Em toda a região produtora do país, uma queda ao longo de anos nos preços do milho, trigo e outras commodities agrícolas provocada por um excesso de grãos em todo o mundo está levando muitos agricultores a se afundar em dívidas. Alguns estão desistindo do negócio, suscitando temores de que os próximos anos possam trazer a maior onda de falências agrícolas desde a década de 80.

A participação dos EUA no mercado global de grãos é hoje menos da metade do que era na década de 70. A renda dos agricultores americanos cairá 9% em 2017, estima o Departamento de Agricultura (USDA), prolongando o maior declínio registrado desde a Grande Depressão pelo quarto ano consecutivo.

Na atual safra, os agricultores dos EUA semearam a menor quantidade de hectares de trigo de inverno em mais de um século.

“Ninguém mais só cultiva cereais”, diz Deb Stout, cujos filhos, Mason e Spencer, cultivam os mais de 800 hectares da família em Sterling, no Estado do Kansas. Spencer também trabalha como mecânico e Mason, como carteiro. “Ter um trabalho paralelo parece o único jeito”, diz ela.

Deb e o marido já faliram antes. Os agricultores da região de Sterling perderam em média US$ 6.400 em 2015, ano com os dados mais recentes disponíveis, após terem tido um lucro médio de US$ 80.800 um ano antes, segundo a associação de gestores agrícolas do Kansas.

A agricultura sempre foi um empreendimento de altos e baixos. Hoje, as oscilações são mais nítidas e menos previsíveis, já que a economia agrícola se tornou mais internacional, com mais países cultivando alimentos para exportação e para suas próprias populações.

A participação dos agricultores americanos no comércio mundial de grãos caiu de 65% em meados da década de 70 para 30% hoje, o que lhes dá menos influência sobre os preços. A existência de mais produtores e mais compradores em todo o mundo também significa mais interrupções potenciais por causa do clima, fome ou crises políticas.

Os preços do milho costumavam variar entre um ano e outro em menos de US$ 1 por bushel. Desde 2006, eles dispararam e caíram mais de US$ 4 por bushel.

Uma década atrás, um boom de biocombustíveis nos EUA e a crescente classe média da China elevaram os preços de culturas como milho e soja. Muitos produtores americanos investiram os lucros inesperados comprando mais terra e equipamentos.

O boom também incentivou agricultores de outros países a acelerar a produção. Produtores de todo o mundo acrescentaram cerca de 73 milhões de hectares de cultivo nos últimos dez anos. Os custos de produção mais baixos, a proximidade com mercados de rápido crescimento e a melhoria da infraestrutura deram a produtores de alguns outros países uma vantagem.

A produção de milho e trigo nunca foi tão grande, e nunca tantos grãos foram armazenados antes.

Desde o início do século XIX até a Grande Depressão, o número de fazendas dos EUA cresceu de forma constante, à medida que os pioneiros conquistavam o oeste. As famílias produtoras geralmente criavam um pouco de gado e cultivavam algumas dezenas de hectares de terra, no máximo. Após a Segunda Guerra Mundial, os tratores e colheitadeiras de alta potência permitiram aos agricultores trabalhar com mais quantidade de terra. Há 20 anos, as sementes geneticamente modificadas passaram a ajudar os agricultores a produzir mais.

 

As fazendas cresceram e se especializaram. As operações em larga escala representam hoje metade da produção agrícola dos EUA. A maioria das fazendas, mesmo algumas das maiores, ainda é administrada por famílias.

Enquanto o tamanho das propriedades se multiplicou, seu número em unidades caiu, de seis milhões, em 1945, para pouco mais de dois milhões em 2015, aproximando-se de um limite visto pela última vez em meados do século XIX. O total de hectares cultivados nos EUA caiu 24%, para 370 milhões de hectares.

A Rússia, entretanto, passou ao longo dos últimos 25 anos do maior importador de trigo do mundo para o maior exportador, diz Dan Basse, presidente da empresa de pesquisa AgResource Co., com sede em Chicago. Os agricultores plantaram ainda mais trigo no ano passado para tirar vantagem do recente aumento do dólar em relação a muitas moedas. Isso incentiva os agricultores russos a exportar tanto trigo quanto for possível em dólar, que hoje rende cerca do dobro de rublos que rendia há três anos.

O dólar forte também permite que agricultores em alguns países reduzam seus preços.

“Como o dólar permanece forte, os agricultores americanos não têm nenhuma alavanca para puxar”, diz Basse. “É uma hemorragia lenta, não um corte na jugular.”

No ano passado, o governo de Barack Obama acusou a China de subsidiar injustamente a produção de trigo e limitar indevidamente as importações de grãos em detrimento dos agricultores dos EUA. Em outubro, o USDA informou que iria pagar mais de US$ 7 bilhões em assistência financeira no âmbito de programas existentes para ajudar os agricultores a sobreviver o momento atual de crise.

As exportações de trigo dos EUA na última safra foram as mais baixas em quase 50 anos, embora analistas do governo esperem que elas melhorem este ano. Basse diz acreditar que já não será economicamente viável para os EUA exportarem trigo dentro de cinco anos.

Os economistas não esperam que a queda atual seja tão severa quanto a crise que atingiu o cinturão agrícola do país na década de 80. Na época, os preços dos grãos despencaram após um boom na década anterior que estimulou os agricultores a expandir a produção, acumulando dívidas à medida que o superávit crescia. O valor das terras agrícolas despencou e as taxas de juros dispararam, provocando um colapso que forçou muitos agricultores e financiadores a sair do negócio.

A expectativa é que, desta vez, os valores das terras agrícolas se mantenham. Os rendimentos agrícolas atingiram recordes em 2013, deixando muitos produtores com reservas de dinheiro significativas. As taxas de juros, embora devam subir, ainda estão perto de mínimas históricas. Embora haja uma projeção que a proporção entre dívida e ativos dos agricultores dos EUA aumente em 2017 pelo quinto ano consecutivo, ela também permanece historicamente baixa.

O custo de insumos, como os fertilizantes, caíram, e os economistas preveem uma pressão crescente sobre os preços das sementes e arrendamento de terras. O aperto poderia aliviar se o clima restringisse as colheitas, aumentando a demanda pelo excesso de grãos dos EUA. Menos comunidades rurais dependem economicamente da agricultura hoje, o que poderia ajudar a isolá-los da crise.

Para alguns, a crise é uma oportunidade. Agricultores com dívidas baixas e escala suficiente para lucrar com as colheitas recordes do ano passado poderiam estar em condições de arrendar ou comprar terras de vizinhos em dificuldades.

Lee Scheufler, 65 anos, expandiu sua fazenda em Sterling em quase 10 vezes ao longo dos anos, começando com 240 hectares 40 anos atrás. Ele guardou dinheiro durante anos lucrativos e recentemente comprou e alugou terras de qualidade superior para substituir algumas de suas áreas mais fracas.

“Tentamos nos posicionar para quando a maré virar”, diz Scheufler, acrescentando que num futuro ele gostaria de passar suas terras para um produtor mais jovem que esteja começando a cultivar, como um vizinho fez por ele.

 

FONTE: The Wall Street Journal

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