Publicação da Embrapa Meio Ambiente
(Jaguariúna, SP) indica conjunto de Boas Práticas de Manejo (BPM) para a
produção de peixes em tanques-rede que atende as regulamentações da Lei
12.651, conhecida como Novo Código Florestal. O Código dispõe sobre a
proteção da vegetação nativa, a adoção de boas práticas agrícolas, como
por exemplo, na prevenção dos processos erosivos do solo nas áreas de
preservação permanente, de proteção ambiental e da preservação dos
recursos hídricos.
Atualmente, a produção de peixes em tanques-rede é praticada em vários
reservatórios e pequenos açudes distribuídos em todo o território
nacional. Nesse panorama, é comum observar vários projetos conduzidos de
forma competitiva e sustentável. Entretanto, ainda há muito que se
fazer para atingir o potencial produtivo ideal. Para isso, é preciso
unir estas iniciativas com os esforços de todos os envolvidos de modo a
conciliar a produção e a preservação dos recursos hídricos a partir do
desenvolvimento e adoção de BPM.
Muitos procedimentos para garantir a melhoria dos índices econômicos e
ambientais estão validados e disponíveis. Assim, a principal questão a
ser respondida é porque muitos piscicultores ainda não adotam BPM e as
aplicam corretamente. O pesquisador Julio Queiroz, da Embrapa Meio
Ambiente, acredita que a resposta pode ser a dificuldade encontrada para
identificar, selecionar e aplicar as melhores BPM na solução de um
problema em particular. “Certamente, existe uma série de recomendações
para superar os problemas relacionados com a escolha do local, com a
qualidade da água, com o manejo alimentar e a prevenção de doenças”.
Conforme o pesquisador, existem várias maneiras para selecionar as BPM
mais adequadas. Erros comuns ainda são recorrentes e vêm comprometendo a
competitividade e a sustentabilidade do setor. É comum observar
sistemas de produção considerados como exemplos de “tecnologia e
eficiência”, onde foram feitos investimentos em grande escala associados
ao uso de tecnologias sofisticadas sem, no entanto, obter resultados
positivos.
Um olhar mais atento irá demonstrar que as principais razões para essas
falhas estão fortemente relacionadas com a falta da adoção de BPM.
Parece que a ideia principal é sempre produzir mais. O que realmente
importa é concentrar esforços no sentido de buscar a redução dos custos
de produção, associados ao aumento dos benefícios econômicos, sociais e
ambientais.
Nos grandes reservatórios, os peixes estão sujeitos a vários impactos
causados não só pelas condições naturais, como também pelas mudanças
climáticas, hidrodinâmica do local e alterações bruscas na qualidade da
água e, ainda, por outros fatores externos como o aporte de matéria
orgânica e, por vezes, de poluentes transportados pelo escoamento
superficial após chuvas intensas.
Com a qualidade da água prejudicada, há redução da produtividade. Uma
das soluções para evitar o aporte de sedimentos, matéria orgânica e
poluentes no interior dos reservatórios é manter uma cobertura vegetal
mais densa e adequada ou construir, na medida do possível, uma pequena
valeta para desviar o fluxo da água para longe das margens dos
reservatórios.
A hidrodinâmica do reservatório é importante porque a distribuição de
oxigênio dissolvido e a maneira como os resíduos e substancias
contaminantes são transportadas e diluídas é determinada pela direção e
velocidade das correntes da água. Outro ponto impactante é a forma do
reservatório e a sua profundidade. Nos locais com pouca circulação de
água, normalmente, ocorre um acumulo detritos e sólidos em suspensão na
superfície da água que irão precipitar e se acumular no fundo,
resultando no aumento da demanda de oxigênio dissolvido, especialmente
em locais onde a coluna da água não é muito profunda.
Por outro lado, onde a profundidade é muito alta pode ocorrer grande
mortalidade de peixes causada pela desestratificação da coluna de água. É
importante observar que os tanques-rede devem ser instalados não muito
distantes das margens para facilitar o acesso, estar distantes o
suficiente para permitir a passagem de barcos e protegidos da ação de
ventos fortes.
Além disso, há os impactos provocados por fontes de poluição difusas
resultantes do uso de agrotóxicos aplicados em sistemas de agricultura
intensiva, além da drenagem de efluentes domésticos e industriais.
As alterações climáticas também podem causar uma série de impactos.
Portanto, para o desenvolvimento de estratégias de adaptação para o
setor produtivo, é essencial entender esses impactos, os seus percursos,
a sua variabilidade e seus riscos. Dentre as BPM apontadas pela FAO,
destacam-se o zoneamento da aquicultura para minimizar os riscos para os
novos empreendimentos e deslocamento para áreas menos expostas;
estratégias para melhorar o monitoramento da saúde dos peixes, aumentar a
eficiência do uso e reciclagem da água e aquaponia aumento da
eficiência alimentar para reduzir a pressão e a dependência de recursos
alimentares; desenvolvimento de estoque de alevinos e pós- larvas melhor
adaptadas, procedimentos de larvicultura mais confiáveis para facilitar
o crescimento em condições mais estressantes e facilitar a reabilitação
da produção após desastres; melhoria dos sistemas de alerta precoce;
reforço e aprimoramento dos equipamentos e unidades de cultivo,
incluindo estruturas com melhor retenção, como por exemplo, tanques-rede
mais resistentes e com profundidade ajustável para flutuação de acordo
com a variação dos níveis da água, viveiros mais profundos, além de
melhoria dos métodos de despesca e agregação de valor.
A alimentação representa mais de 50% dos custos totais. Os restos de
ração não consumida, somada aos dejetos causam uma série de alterações
na qualidade da água, no equilíbrio ecológico dos reservatórios e também
na área de influência.
Outro ponto de destaque é a temperatura da água, que nos grandes
reservatórios pode sofrer variações em função da ocorrência de frentes
frias e dias nublados, durante os quais a redução da atividade
fotossintética poderá diminuir a concentração de oxigênio dissolvido, e,
em muitos casos, promover a mortalidade em massa das microalgas.
Outro fator é o resfriamento noturno, que diminui a temperatura da água
superficial, ocasionando a estratificação da coluna da água. Além das
estações do ano, os ventos, as calmarias, as chuvas e os sólidos em
suspensão. O importante é selecionar uma espécie de peixe que já esteja
bem adaptada ao clima local.
A concentração de oxigênio dissolvido é a variável mais crítica para os
sistemas de produção em grandes reservatórios e está diretamente
relacionada ao manejo e à alimentação. Antes de estocar os peixes é
preciso determinar a quantidade de oxigênio dissolvido que será
consumida para assegurar a sobrevivência e o crescimento satisfatório
dos peixes.
Aponta-se que as causas mais comuns de estresse estão diretamente
relacionadas com a composição da ração e com a sua capacidade de
satisfazer as exigências nutricionais das diferentes espécies, sendo que
o uso de rações de baixa qualidade aumenta as chances de ocorrência de
doenças e mortalidade. Além da utilização de densidades de peixes muito
elevadas.
Algumas BPM são fundamentais - controle da erosão e do aporte de
sedimentos, adoção de boas práticas de conservação do solo e preservação
da cobertura vegetal, proteção das margens, construção de terraços ou
valetas para desviar o excesso de escoamento superficial, manutenção de
um tempo mínimo de retenção hidráulica, drenagem periódica dos viveiros
e/ou pequenos reservatórios rurais e manter o gado longe dos
reservatórios.
Boas práticas para redução da carga orgânica - usar ração peletizada,
estrusada e com concentrações adequadas de nutrientes, monitorar a
temperatura da água e selecionar quais são as variáveis de qualidade de
água que afetam o consumo de ração. Temperaturas altas associadas a
valores de pH altos resultam em um alto percentual de amônia não
ionizada que pode estressar os peixes, reduzir o apetite e, ainda, a sua
habilidade de converter a ração consumida em ganho de peso e
crescimento; reduzir a quantidade quando há acumulo de ração na água. No
caso de distribuição manual, observar o comportamento dos peixes para
evitar alimentar os peixes em excesso, reservar um espaço ventilado,
seco e protegido de roedores para estocar a ração, que deve ser
consumida antes do vencimento da data de validade.
Conservação dos recursos hídricos - usar poucas fontes de água para
abastecimento, para assegurar um controle melhor e mais eficiente da
quantidade e da qualidade da água; reservar uma área para tratamento de
esgoto e resíduos de animais; evitar o armazenamento de produtos
químicos como fertilizantes, agroquímicos e combustíveis perto dos
reservatórios, evitar a construção de novos viveiros e reservatórios em
áreas de drenagem nas bacias hidrográficas já impactadas com loteamentos
de casas e atividades industriais ou agrícolas, e também a construção
de reservatórios onde o solo tenha um teor muito baixo ou excessivo de
argila. Solos com baixo teor de argila apresentam alta infiltração e
solos com alto teor, apesar de terem boa compactação, não são indicados
para a construção de diques e taludes devido a sua instabilidade, além
de reduzir a frequência das trocas de água, o que também reduz o
potencial de poluição e os custos com bombeamento.
Algumas BPM indicadas são resultantes de vários projetos de pesquisa
conduzidos pela Embrapa Meio Ambiente em parceria com a Auburn
University, EUA, com algumas Unidades da Embrapa e outras instituições
de fomento, ensino e pesquisa, tais como a FINEP, CNPq, e APTA – Polo
Regional do Leste Paulista.